terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Um ano de blog!

Não tem jeito, não é, gente? Todo ano é a mesma coisa: o Natal é um dia só, mas a gente fica enrolado o mês de dezembro inteiro! Vinte dias sem escrever, muita coisa para mostrar e contar, mas vai ter de ficar para depois das festas.

Mas volto em breve, com uma postagem para comemorar o primeiro aniversário do blog, que aconteceu nos primeiros dias de dezembro.

Até lá e...


terça-feira, 27 de novembro de 2012

É verão. E agora?

Agora é hora de fazer um tricô mais light - boa oportunidade para experimentar fibras mais apropriadas para o calor - como o algodão e o bambu. Eu amo, adoro lã. E sempre tive um pouco de implicância com o algodão - mais pesado e sem elasticidade. Mas o calor vai ficar por aqui uns bons três, quatro meses; então decidi abandonar meu preconceito este ano.

E não é que o resultado tem sido legal? Fiz essas duas peças recentemente:



Ambas são em 100% algodão - a primeira utiliza o fio Anne (dois fios juntos) e a segunda é em Duna, que tem o dobro da espessura do Anne.

Se gostei? Do resultado visual, sim. Vamos ver se essas peças não deformarão com o uso. Mas ainda insisto que tricotar com fio de lã natural é muuuuuuito mais gostoso.

No momento estou experimentanto uma outra opção - uma mistura de merino com viscose, 50% cada. Trata-se de um fio da Ice Yarns, fabricante na Turquia, que vende super barato no eBay. Já usei esse fio em outra ocasião, na peça abaixo:


A peça ficou molinha, gostosa, drapeia bem. Mas... apesar de não ter nenhuma aparência de "lã", o fio esquenta, viu? Estou agora tricotando um bolero sem costuras com o mesmo fio em outra cor, mas acho que não vai rolar usar no verão, não - mesmo no verão aqui do Sul de Minas. O fio tem um toque geladinho, mas sinto as mãos esquentarem depois de um tempo tricotando. A peça, que ainda vai levar um tempo para ficar pronta, é a seguinte:


Depois de pronta eu mostro novamente!

Mas essas experiências não significam que vou deixar a lã inteiramente de lado durante todo o verão. Acabo de receber um pacote com duas novas fibras que vou fiar agora para tricotar quando o frio chegar. Já expliquei aqui que há centenas de tipos de lã, e nenhuma é necessariamente boa ou ruim - depende do propósito. Por enquanto já falei do merino, que é a lã mais facilmente encontrada, e da alpaca. Mas agora vou partir para novas experiências - com as raças Falkland e Blue-faced Leicester (conhecida como BFL). São essas duas coisas lindas aqui:


Ao abrir o pacote e antes de removê-las do saco transparente a primeira impressão que tive foi de muito, muito crimp. Já expliquei o que é isso aqui. Deu para ver só de olhar, e depois o toque confirmou. O merino é lustroso, sedoso. Mas essas fibras têm uma aparência menos "penteadinha". Como nosso cabelo quando fazemos escova e depois cai aquela chuvinha...e o cabelo vai recuperando o volume! Então elas devem render um fio muito aerado e fofinho - vamos ver. Depois eu conto.

As cores são um espetáculo à parte... esta é a Falkland - o nome da cor é clematis vine:


Eu sabia tratar-sede uma trepadeira, mas fiz uma busca pela foto da planta - olha só o que encontrei:


Daí o tingimento da fibra em tons de verde e violeta. E abaixo está a BFL na cor fern:


Os muitos tons de verde sugeriam que fern é uma planta, também. Fui pesquisar de descobri que são nossas populares...samambaias!


Comprei essas fibras lá de fora, pela internet, no site da Spinning Bunny. A pessoa que me "atende" e se comunica comigo chama-se Susan e finaliza todos os e-mails com a palavra "Namastê". Sugestivo, não?

Mas, por mais que seja prático, econômico e divertido descobrir essas delícias online, não deixo de sonhar com o dia em que teremos acesso a muitas opções de fibras de qualidade aqui mesmo, no Brasil. E tingiremos a lã de nossos carneirinhos, e batizaremos as cores com nomes como Ipê Amarelo, Quaresmeira, Resedá, Acácia... é para isso que estamos trabalhando, né?

Espero mostrar um pouco desses fios na próxima postagem. Até lá!

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Canção para mulheres de fibra

Essa é especial para tricoteiras, crocheteiras, costureiras, fiandeiras, tecelãs... enfim, mulheres de fibra! Roberta Sá e o Trio Madeira Brasil - "A Mão do Amor":


Eis a letra - é ou não é para nós?

"Eu queria que a mão do amor
Um dia trançasse
Os fios do nosso destino
Bordadeira fazendo tricô

Em cada ponto que desse
Amarrasse a dor
Feito quem faz um crochê
Uma renda, um filó
Unisse as pontas do nosso querer
E desse um nó
Nó de muringa de correr
Nó de fié
Nó de guia, botão de rosa
Nó de ané"

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A Dama do Tricô

Essa semana eu recebi pelo correio um kit com DVDs que havia encomendado: "Knitting Workshop", com Elizabeth Zimmermann.

O que faz as pessoas se interessarem por esse material até hoje?



EZ, como é chamada no universo dos trabalhos manuais, nasceu na Inglaterra em 1910; estudou na Suiça e na Alemanha, testemunhou a luta pela sobrevivência financeira da família após a Primeira Guerra e foi morar nos EUA um pouco antes da Segunda Guerra Mundial, acompanhando o marido alemão e nada queridinho dos nazistas. Tirando esse episódio, sua vida foi pacata e centrada. Elizabeth passou a vida educando uma família ("sem televisão em casa"), lendo muito, pintando quadros, tricotando e inventando. Ou "unventing", como ela gostava de dizer em seus vários livros publicados: ela dizia que quase tudo já foi inventado, mas você pode adaptar e aperfeiçoar - ou "unvent'.*

E o que ela "unventou"? Basicamente ela bolou jeitos mais eficazes e simples de se fazer quase tudo em matéria de tricô. Costurar as peças de um suéter não é um saco? Elizabeth criou o suéter sem costura, tricotado em agulha circular. Ficar trocando as cores do fio nas mãos é difícil? Elizabeth descobriu que é possível tricotar com as duas mãos ao mesmo tempo, uma cor em cada mão, para criar padrões. Não consegue encontrar uma receita de suéter que sirva para seu fio e sua tensão? Elizabeth criou o sistema EPS - ou "Elizabeth's Percentage System": não importa o fio ou a tensão, é só você definir o número de pontos para o corpo do suéter; o restante das medidas são porcentagens fixas desse número inicial. Receitas, nunca mais!

Além da inventividade, o talento para ensinar também estava presente: EZ parecia antecipar as dúvidas que as tricoteiras teriam na execução de suas instruções, e sabia como nos esclarecer e tranqüilizar. Houve mais de uma situação em que fiquei na dúvida, e li em seguida: "Eu sei que isso parece confuso, mas tenha fé e confiança, pois logo essa manobra fará sentido." E fazia. Seus livros me convenceram de que eu era capaz de fazer coisas que eu julgava impossíveis, antes - como meu primeiro par de meias. Ela prova por A + B que todo mundo pode fazer, sim.

Enfim, Elizabeth revolucionou o tricô e através de seus livros ofereceu aquilo que é o maior presente para qualquer artesão: liberdade de criação. Autonomia. Independência. Ela também advogava o uso da lã natural (opa, temos algo em comum!) e falava sempre em "resourcefulness" - palavra que já me inspirou uma postagem.


Mas não é por isso que seus livros são raros e venerados até hoje. Não foi por causa disso que sua família fundou a editora School House Press, adminstrada hoje por sua filha Meg Swansen; não é por isso que até hoje centenas de tricoteiras disputam vagas nos acampamentos de verão que Meg organiza (iniciativa de Elizabeth, anos atrás). E não foi , também, por causa do tricô que comprei os DVDs com todas as aulas que Elizabeth apresentou na TV americana.

O fato é que,  muito mais do que uma grande tricoteira e "unventora", Elizabeth Zimmermann era um ser humano iluminado, com um carisma e capacidade de comunicação formidáveis. Seus livros não são lições de tricô. São literatura. Ela ensina o que tem a ensinar, mas faz isso "conversando", tecendo histórias, salpicando ironias aqui e ali, entretendo. Nos dois primeiros livros ela fez isso sem intenção, mas em "Knitting Around" seu talento para escrever já era tão respeitado que as histórias foram incluídas no livro de propósito: capítulos intercalados com as lições, contando sobre sua infância, seus tempos estudando arte na Alemanha, o início do namoro e a escapada estatégica para a América quando o Nazismo ganhou força. Por que as tricoteiras haveriam de se interessar por essas histórias pessoais? Porque o bom narrador sabe tornar qualquer história interessante.

Tendo lido - e relido - todos os seus livros, imaginei: se é tão gostoso lê-la, como deve ser assistí-la? Encomendei o DVD e não estava enganada: pus a primeira mídia no notebook só para testar, mas de cara assisti a três episódios - 25 minutos cada. Não senti o tempo passar.

O material é simples: produção modesta, cenário mínimo, iluminação ruim, chiados, nada de maquiagem ou roupas atraentes à la Ana Maria Braga ... só Elizabeth, de rosto limpo e cabelos brancos, falando sem parar, demonstrando técnicas, um gato branco e preto na bancada e muitos novelos de lã ao redor. Só. Mas é o bastante.


A notícia da morte de Elizabeth Zimmermann, em 1999, ganhou obituário de destaque no New York Times. E em 2010, ano de seu centenário, o livro Knitter's Almanac foi relançado em edição comemorativa de grande sucesso. Inúmeros autores citam Elizabeth em seus livros. No Ravelry, comunidade virtual de tricô e crochê que já mencionei aqui no blog, há 185 projetos seus, todos avidamente tricotados por muita gente. Um deles, um casaco de bebê de construção modular, foi tricotado 18.652 vezes e deu origem a 1.878 postagens em blogs. 

Vou encerrar com uma frase sua: no finalzinho do livro Knitting Around - ou "Tricotando Por Aí" - ela faz um resumo de sua vida, dos altos e baixos, de haver sobrevivido a duas guerras mundiais, das dificuldades, incertezas e recomeços; e faz uma comparação com o tricô: If you drop a stitch, pick it up immediately. Traduzindo: "Se perder um ponto, recupere-o imediatamente".

Editoras brasileiras, que tal lançar esses livros por aqui, em português?

Até a próxima!

* un, em inglês, é um prefixo de negação - como o "des" em português: descarregar, descascar; no trocadilho de Elizabeth, "unvent" seria algo como "desinventar".

domingo, 4 de novembro de 2012

Histórias das Fibras de Minas

Ando ocupada com a mostra de patchwork que ainda está em cartaz, e até dei um tempo na busca de histórias sobre as fiandeiras de Minas. Mas não tem jeito: as histórias me acham. Esta gravação foi postada pelo Rodrigo Tecelão e é um presente: entrevista com D. Zélia Scholz, de quem já falei aqui antes, e D. Maria de Lourdes Pereira Araújo - ambas aqui de Minas, falando sobre o artesanato têxtil em suas famílias - desde as bisavós!

http://soundcloud.com/scholzrene/maria-de-lourdes-pereira-de

Lá para o finalzinho D. Zélia sai com essa pérola de declaração:

"A fibra é muita fina; no momento em que você torce elas se unem, se abraçam, se entrelaçam... e se tornam uma potência. Assim é a vida de determinadas pessoas, que fazem ao redor delas muitas amizades, formam um povo solidário".

Fechei o fim de semana com chave de ouro. Boa semana!

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Quer experimentar?

Não é bom negócio ficar só vendo as fibras: tem de pôr a mão, tocar, sentir... as diferenças são muitas - não dá para perceber só no olho.

Quem estiver aqui pela região pode ter essa experiência: montei um cantinho especial só para isso dentro da 4ª Mostra de Patchwork de Pouso Alegre, que começou sexta passada.


A mostra acontece na Galeria Artigas, ao lado do Teatro Municipal, e está aberta ao público de segunda a sexta, do meio-dia às seis da tarde. Nesta quinta e sexta, por causa do feriado, a galeria não vai funcionar. Eu estou lá todos os dias à tarde, fazendo demonstrações de patchwork e fiação artesanal com roca de pedal e fuso de madeira. Levei diferentes tipos de fibras e fios artesanais para quem quiser conhecer.

Eu já mencionei aqui a feltragem com lã de carneiro, mas ainda não expliquei bem o que é - vou fazer isso em breve. Ando fazendo algumas experiências e estou empolgada com um teste que deu certo: a lã pode ser feltrada sobre os tecidos de algodão! Este painel em patchwork é um exemplo - a árvore foi feltrada sobre ele:


No departamento "lã", também estamos apresentando vários modelos de bolsas feltradas:


Já disse aqui que minhas fotos internas nunca ficam boas, né? Essa tá muuuuito ruinzinha. Então vá lá ver pessoalmente, conversar conosco, aprender, experimentar! Além do projeto AVE LÃ, você também vai ver muitos lindos painéis em patchwork. Alguns exemplos, só para dar água na boca:





A mostra permanece na galeria até o dia 7 de novembro e a entrada é franca. Até lá! 

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Oh, o príncipe...!

Na boa: agora eu estou me achando!


O Príncipe Charles e eu temos algo em comum (eu preferia ter algo em comum com a Kate Middleton, sua norinha da foto acima, mas ele também serve): há meses eu estou por aqui fazendo meus discursos de reverência à lã, e agora descobri que o príncipe é patrono de uma campanha mundial a favor da revitalização do uso da lã natural!


Traduzindo do site:

"A Campanha Pela Lã" é uma iniciativa de indústrias diversas, convocada por Sua Alteza Real (aff!) o Príncipe de Gales em janeiro de 2010. Como sério ambientalista, o príncipe acredita que a origem natural, sustentável da lã e sua estrutura técnica podem oferecer às indústrias da moda, de interiores e da construção muitas vantagens. Escolher a lã natural - segundo o entendimento do príncipe - também ajuda a cuidar de nosso planeta. Os esforços combinados das principais organizações, associações e indústrias têxteis pelo mundo criaram uma campanha para promover as maravilhosas propriedades que a lã oferece; e, assim procedendo, ajudam a manter o setor de criação ovina e a comunidade têxtil internacionalmente."

Bacana. 

E esse pessoal promove eventos inacreditáveis! No mês passado eles comemoraram o lançamento da campanha nos Estados Unidos -  trazendo carneiros para o coração de Nova York! Os animais vieram de Rhineback, região rural onde há um festival anual de fibras que a cada edição torna-se mais popular. O evento ocupou e transformou todo o Bryant Park, em Manhattan: árvores e cadeiras foram cobertas por lã Harris Tweed em cores vibrantes, o chafariz central virou uma escultura de lã, e as pessoas circularam no meio dos carneiros; uma loja de fios local promoveu um encontro de tricoteiras e uma designer da revista Vogue Knitting exibiu um chapéu maluco e um xale tricotado à mão. Algumas fotos do evento:


No Brasil não temos uma campanha bem organizada assim, mas tenho mostrado aqui o trabalho silencioso, de formiguinha, de pessoas que têm se esforçado por oferecer a um mercado nascente produtos naturais e diferenciados - como o pessoal da La Rocca Fios e da Fazenda Caixa D'água, que citei em postagens diversas. Ou as sementinhas plantadas por Cecília e Guaracy, do Sítio Duas Cachoeiras, que se dedicam a ensinar, educar gerações futuras.  E euzinha aqui em Minas, escrevendo este blog e tentando converter pessoas para o uso da lã natural. Como parte de meus pequenos esforços, estarei a partir da quinta que vem, dia 26, fazendo demonstrações de processamento de lã, fiação artesanal e feltragem durante a 4ª Mostra de Patchwork de Pouso Alegre. O evento vai até 7 de novembro. Até lá!

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Buscando na Fonte

Ajudando a divulgar: mês que vem a Cecília Camargo do Sítio Duas Cachoeiras vai oferecer dois dias de cursos naquele pedacinho do céu que já mostrei aqui. Uma forma maravilhosa de aprender fiação artesanal e tingimento vegetal. Aproveitem!


quinta-feira, 4 de outubro de 2012

O Milagre da Transformação

Fala a verdade: dá para acreditar que isto...


...era isto?


Continuo aqui com minhas experiências em processamento de fibras, e é muito interessante ir aprendendo e vendo as modificações que a fibra sofre - em minhas mãos, diante de meus olhos! Por que será que gosto tanto desse processo? Talvez porque nunca freqüentei o jardim de infância, nunca fiz aqueles projetos que causam uma tremenda sujeira e deixam as professoras loucas com uma dúzia de crianças de mãozinhas sujas? Deve ser.

Essa lã que estou mostrando ainda é aquela do Seu Arlindo. Aquela. Já peguei e larguei dela várias vezes, e recentemente peguei de novo por conta de ter, finalmente, comprado um par de cardas para me ajudar no processamento.



Até agora só descobri um fabricante no Brasil, elas custam absurdamente caro e são objetos simples e rústicos. O preço alto é por conta da parte com os dentes de aço - quase ninguém fabrica isso. Não vou contar quanto paguei aqui - dá até vergonha. Mas digo: custou apenas 100 reais menos do que minha roca, que é um objeto de madeira nobre, bem torneado, cheio de detalhes.

Mas enfim, tomei coragem e comprei meu parzinho no site da Selaria Dias; chegou rápido e na mão elas são até mais rústicas e feínhas do que nas fotos. Lixei e dei um trato nelas com cera de carnaúba - nada como uma maquiagem, né?

O grande problema, no entanto, foi este:


À direita está o meu merino branquíssimo, que já compro penteado, lá do Rio Grande do Sul; à esquerda está a mesma fibra depois de cardada. Ficou encardida, né? Pois é: os dentes das cardas vieram oxidados - uma coisa sutil, quase imperceptível. Meu merino foi quem denunciou!


Fiquei indignada a princípio e quis devolver o produto. A loja não criou qualquer dificuldade e declarou-se pronta a cancelar a comprar e restituir meu dinheiro. Mas aí conversei daqui, dali, perguntei, pesquisei... afinal, ainda não descobri onde comprar outro par. Acabei ficando com elas; limpei os traços de ferrugem com vinagre e uma pasta de bicarbonato de sódio e água. Saiu tudo. Mesmo assim, não deixo de lamentar que no Brasil a gente ainda tenha tão poucas opções, e que como consumidores ainda sejamos tratados com esse descuido: pelo que entendi, quase não há demanda para esse produto, ainda, e depois de fabricado ele fica "dormindo" mais tempo que a Bela Adormecida na prateleira. Por isso a oxidação. Mas e eu com isso? Paguei caro e acho que merecia ter recebido um produto pronto para o uso.

Problema resolvido, agora as cardas estão quebrando um galhão. Em minhas tentativas anteriores de fiar a lã do Seu Arlindo, eu tinha de fazer muita força para desfiar as fibras na quantidade certa. Agora depois de cardá-la, fica muuuuuuito mais fácil e até gostoso. Compare:


1. Esse é um punhado da lã antes de lavar...
2....e já lavado, pendurado para secar.
3. A lã lavada ainda tem vestígios de matéria vegetal.
4. A carda abre as fibras e remove quaisquer vestígios.
5. Rolinho pronto para fiar.

E agora é só diversão:


Esses dias vou visitar o Seu Arlindo e levar um rolinho da lã já fiada para ele ver. Quando fui buscar o velo, em janeiro, ele me olhou um tanto surpreso, provavelmente achando exquisito eu querer levar para casa aquela "coisa" - a lã que estava jogada em um galão e ele ia incinerar. Nem eu mesma tinha tanta fé naquela fibra. Mas tinha de experimentar - fazer o quê? Ossos do ofício. Em tempo: milagre algum tornaria essa fibra suave como o merino; cada lã tem seu propósito. Ela será usada para projetos utilitários - nunca um cachecol!

E nos dias 26 de outubro a 7 de novembro eu e o pessoal da ACAJAL vamos estar com exposição montada aqui em Pouso Alegre, na Galeria Artigas (ao lado do Teatro Municipal). A mostra é tradicionalmente de patchwork, mas vamos apresentar também o projeto da lã de carneiro. Quem nos visitar vai poder "ver com as mãos" e experimentar fiar no fuso e na roca - além de conhecer lindas peças feltradas. Não percam!


quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Espalhando a sementinha

O "Falando de Fibras" está caminhando para um ano de existência... e ao longo dos meses eu deixei transparecer, em algumas postagens, a solidão que sentia por me dedicar a um artesanato quase perdido no tempo - e a alegria cada vez que descobria alguém, em algum lugar, que também fia e valoriza esse costume secular. Na segunda passada esse prazer de compartilhar teve seu momento de glória: fiei em público em uma exposição da qual participei e me deliciei com a reação das pessoas!

Foi durante a 1ª Semana do Turismo do Circuito Serras Verdes, do qual Pouso Alegre faz parte; houve eventos durante todo o dia no lindo prédio do antigo fórum da cidade, e o Núcleo de Artesanato da ACAJAL foi convidado a montar uma exposição para os visitantes. Levamos o patchwork - que sempre encanta, mas não foi surpresa porque já é a quarta vez que expomos na região - e o projeto AVE LÃ!, que resgata o trabalho artesanal com lã de carneiro: estavam lá nossas primeiras peças feltradas e também a roca e os fios artesanais.

Foram horas e horas cardando, fiando e conversando com os visitantes. A reação era sempre de espanto - no caso dos que nunca haviam visto uma roca - ou de encantamento ao lembrar de momentos da própria infância: muitos exclamaram imediatamente ao entrar: "Olha, uma roca, minha avó (ou mãe, ou tia) tinha uma!" Alguns não lembravam o nome do objeto. A maioria não sabe o que foi feito da roca da família....

Isso é muito triste, mas ainda temos tempo de resgatar essa arte antes que se perca. Desse evento da segunda-feira uma certeza ficou: o ser humano sempre teve e terá o poder de transformar os recursos que tem e fabricar o que precisa, e ninguém fica indiferente ao testemunhar essa transformação. Pura mágica.

Abaixo, algumas fotos da exposição:


A manta rosa em primeiro plano existe há mais de sessenta anos! Foi feita pela família da Fátima, de Santa Rita de Sapucaí (contei essa história em uma postagem duas semanas atrás), com lã de ovelha fiada, tingida e tecida artesanalmente. 

Montamos esse espaço rústico e gostoso para as demonstrações.

As bolsas feltradas chamaram a atenção mesmo penduradas entre as peças em patchwork.

Eu e Marilda, visitante da exposição.

Um close de algumas das peças feltradas. Estou devendo escrever aqui sobre feltragem, eu sei. Breve, prometo!

Esta foi uma exposição pequena, que durou apenas um dia. Mas de 26 de outubro a 07 de novembro vamos estar com uma mostra bem maior montada na Galeria Artigas. Todos os dias haverá demonstrações de patchwork e do trabalho com a lã de carneiro. Não percam!


Em tempo: reportagem no Jornal do Estado sobre o evento: http://www.jornaldoestado.net/noticias/noticia.php?id=22be9d630e7d3733a166f8136d9d064e

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Desabrochando...

Quando você trabalha em um projeto desde a fibra bruta, passando pela fiação, até chegar ao tricô, pode dizer que ele desabrochou: esse é o cachecol que fiz com a fibra que já mostrei aqui na última postagem - o merino + tencel na cor hibisco:


Eu amo, a-m-o essa cor! Ou melhor, "cores", no plural, por que não há como definí-la.

A receita é a Helix Scarf, publicada pela revista Spin-Off.Como é gratuita acho que posso traduzir aqui. Super simples:

- monte 24 pontos na agulha;
- trabalhe 1 carreira em meia;
- continue trabalhando em meia, mas:
     1) faça oito pontos, meia volta (volte para o início);
     2) faça 4 pontos, meia volta (volte para o início); 
     3) faça uma carreira completa.

Aí é só repetir até o tamanho desejado. Usei cerca de 200 metros de fio. Se estiver usando um fio mais fininho, você pode também tricotar em 30 pontos, e fazer a meia volta em 10 e 5 pontos. Receitas assim, totalmente em cordões de tricô, são ótimas para realçar fios artesanais e variações sutis de cor.

E por falar em desabrochar, dias atrás mostrei foto de minha orquídea cheia de botões. Olha só como ela está agora:


São os pequenos milagres.

Por hoje é só. Inté!

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Era assim...


Top penteado - 50% merino, 50% tencel. O nome da cor é Hibiscus.


... e ficou assim:

Dois fios torcidos juntos (2-ply). Rendeu cerca de 210 metros.


E algumas fotos do processo:

Fiei na roca de pedal...

...depois mergulhei na bacia com água e um pouquinho de amaciante, espremi o excesso e esperei (impacientemente) secar.

E hoje cedo quando fui lá atrás de casa (onde tem luz boa) fotografar o comecinho do tricô, não resisti e tirei essas fotos:

Os gerânios e a bouganvillea estão felizes que só vendo! (participação especial do bumbum da Kimee, no cantinho à direita).

Minha orquídea cheia de botões.

Agora é oficial: a primavera está aí!

Até breve!

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Manhã de Segunda-feira...

...é coisa que quase ninguém gosta... Principalmente se o fim de semana foi prolongado, como este último. Aquela preguiça de retomar a vida normal, a rotina... Mas hoje eu comecei a semana completamente fora da rotina, e nem lembrei que era segunda-feira!

Fui a Santa Rita do Sapucaí, município a 20 quilômetros daqui, visitar uma pessoa que, sabendo de meu interesse por fibras e fiação, gentilmente me convidou para conhecer os tesouros de sua família. A Fátima Scudeler foi minha aluna de patchwork uns anos atrás, e seu interesse por antigüidades e artesanato sempre foi evidente. Então eu já sabia que essa visita ia ser super bacana. Mas foi muito mais: para alguém como eu, a casa dela é um parque de diversões!!! Vejam só se eu não tenho razão:

Para começar, Fátima coleciona máquinas de costura vintage. Os modelos abaixo são apenas alguns que encontrei lá - tem de tudo, de pedal e de manivela, com todo modelo de gabinete que se possa imaginar...


Algumas dessas máquinas são relíquias de família; como também o são as mantas de lã de carneiro, fiadas, tecidas e tingidas artesanalmente na propriedade da família:


Segundo ela, essas mantas eram feitas por colonas portuguesas que viviam e trabalhavam na fazenda da família, em Santa Rita do Sapucaí, gerações atrás. Ela ainda lembra de haver carneiros lanados na propriedade quando era criança. E conserva, daquela época, uma saca de lã bruta de carneiro - que agora ela mesma carda e fia:

Par de cardas para lã - estão na família de Fátima há gerações!



Lã bruta e lã fiada em bolas.


Fátima também vem praticando tecer peças no tear utilizando a lã que fia:


Além da fabricação de fios para uso no tear, a lã bruta também era empregada no recheio de acolchoados; essas peças são, apesar de quentes, incrivelmente leves - graças às propriedades térmicas da lã. Eu disse "são quentes", no presente, porque Fátima ainda tem algumas dessas peças:



Mas as estrelas mesmo - "estrelas" porque são tão raras! - são as duas rocas de fiar que Fátima ainda guarda:





Já pesquisei muito a existência de rocas originais aqui na região toda. Acreditem, é muito difícil encontrá-las. Algumas vezes fui atrás de indicações em cidades vizinhas e chegando lá a peça era, na verdade, um tear. Os dois objetos são normalmente confundidos. 

Essa visita foi parte do projeto de pesquisa e resgate da utilização da lã de carneiro no Sul de Minas, conduzido pela ACAJAL. A opinião de Fátima coincide com o que tenho apurado em minhas pesquisas: aos poucos, com a modernização e o acesso fácil a itens comprados nas lojas, o interesse pela lã diminuiu e os criadores que restaram hoje preferem as raças voltadas para o corte, mais fáceis de cuidar. É a desistência das tradições, o abandono de artes seculares a favor do "prático". Felizmente, esse panorama está mudando e hoje os costumes artesanais estão voltando a ser valorizados. A ACAJAL espera que voltemos a ver carneirinhos lanados misturados à paisagem da região.

Enfim, essa foi uma manhã recheada de curiosidades, histórias, relíquias... E, como se tudo isso não bastasse, da varanda de Fátima, enquanto conversávamos, ainda fui brindada com esta vista:


Manhã de segunda-feira assim é bom, não é?

Até a próxima!